O zagueiro Serginho, do São Caetano, não resistiu à parada cardiorrespiratória sofrida na partida contra o São Paulo, no estádio do Morumbi. O jogador de 30 anos morreu às 22h45 do dia 27 de outubro de 2004. O duelo foi suspenso enquanto estava 0 a 0. Passados quase dez anos, que se completam na próxima segunda-feira, a notícia segue fresca na memória dos principais personagens daquela noite.
Pela primeira vez em sua história, o futebol brasileiro de alto nível viu de perto a morte em campo. Serginho desabou nos pés do atacante Grafite, ex-São Paulo, aos 13 minutos e 49 segundos do segundo tempo. O relógio marcava 21h49. O atacante não percebeu de imediato a gravidade da situação – este papel coube ao goleiro Sílvio Luiz, do time do ABC, que imediatamente passou a ventilá-lo. Durante quase uma hora, tentativas de reanimar o atleta e desespero se misturaram até o anúncio inevitável.
O iG Esporte falou com amigos, companheiros de trabalho e médicos que participaram daquela fatídica noite de quarta-feira e a recontaram minuto a minuto. Noite que mudou para sempre o rumo da medicina esportiva no Brasil e condenou o São Caetano ao purgatório.
20h30 – Rola a bola para São Paulo x São Caetano
São Paulo e São Caetano se enfrentam em jogo válido pela 38ª rodada do Campeonato Brasileiro (de um total de 46). Ambas as equipes estão com 65 pontos e brigam na parte de cima da tabela. O líder Atlético-PR tem 69 pontos, enquanto o Santos, segundo colocado, 68.
21h49 – Serginho passa mal e desmaia no gramado

Gazeta Press
Goleiro Silvio Luiz foi o primeiro a perceber gravidade da situação de Serginho
Com 13 minutos e 49 segundos do segundo tempo, jogo empatado em 0 a 0, veio o mal súbito. Serginho cai dentro da área nos pés do são-paulino Grafite, que se esquiva. O primeiro a perceber a gravidade é o goleiro Silvio Luiz, que logo chama os médicos para o gramado. Desesperados, jogadores das duas equipes clamam pelo apoio da ambulância, parada do lado contrário do campo.
Entre os que gritam desesperadamente por ajuda está Marcinho, um dos mais próximos do “Cabeção”, apelido dado a Serginho no elenco. Eles moravam no mesmo prédio e suas esposas eram amigas. “Estava próximo quando ele caiu e deu para ver a gravidade. Foi desesperador”, contou o meia, atualmente jogador do Ituano.
21h50 – Atendimento no gramado
Atentos ao desespero dos jogadores, os médicos invadem o gramado e já começam os primeiros socorros cerca de trinta segundos depois da queda de Serginho. Paulo Forte, médico do São Caetano, faz a respiração boca a boca, enquanto o massagista Itamar Rosa realiza a massagem no peito do zagueiro. Ao perceber a gravidade do caso, José Sanchez, médico do São Paulo, corre para o campo para ajudar.
"Muitas vezes os jogadores chamam com pressa e não é nada importante. Eu vi o doutor do São Caetano indo ao local e na medida que ele chegou, e dos gestos que ele próprio manifestou, a gente viu que a coisa era séria. Corri eu e meu massagista e tentamos auxiliar, tentar organizar aquele processo. Na hora você não pensa nada. Você não vai pensar que é isso que está acontecendo. Você não está em uma partida de futebol esperando ver um jogador ter uma parada cardiorrespiratória. Você nunca pensa, é a última coisa que você pensa. Aquele momento foi tristemente marcante", afirmou Sanchez.

Gazeta Press
Desespero e tentativas de reanimação se misturaram no Morumbi
Superintendente e também médico do São Paulo na época, Marco Aurélio Cunha assiste à partida do vestiário e prontamente sobe ao gramado ao perceber que se tratava de uma parada cardiorrespiratória.
“Estava frio e fiquei no vestiário assistindo ao jogo. Quando me dirigi ao campo, o Paulo Forte e o José Sanchez estavam com ele na maca chegando na ambulância. Fiz o gesto de bater na ambulância para alertar os socorristas, mas ali vi que a situação era dramática e praticamente irreversível”, relatou Cunha.
21h55 - Serginho entra na ambulância e é levado para hospital
No trajeto feito pelo carrinho com a maca até a ambulância, Forte e o massagista seguem com as manobras de ressuscitação. Fabão, zagueiro do São Paulo, ajuda a carregar Serginho até o veículo. Ele é levado primeiramente para o centro médico do Morumbi, mas dentro da ambulância, Serginho recebe o primeiro choque com o desfibrilador.
22h05 – Zagueiro chega ao hospital
Cerca de 25 minutos depois de desmaiar no gramado do Morumbi, Serginho chega ao Hospital São Luiz, próximo ao estádio.
22h13 – Árbitro comunica fim de jogo

Gazeta Press
Jogadores de São Paulo e São Caetano fizeram orações por Serginho no Morumbi
Enquanto Serginho é atendido no hospital, o árbitro Cléber Wellington Abade comunica a imprensa de que o jogo estava suspenso.
“Eu tinha marcado falta do Jean em cima do jogador do São Caetano (Anderson Lima) e quando eu virei para reiniciar o jogo, ele (Serginho) já estava se debatendo no chão. Nós entramos em contato com ambos os capitães e os dois disseram que seus jogadores estavam bastante abalados psicologicamente e não teriam condições de dar continuidade à partida”, disse o árbitro.
22h45 – Serginho não resiste e morre
No momento em que Serginho lutava contra a morte no Hospital São Luiz, parentes e amigos do zagueiro já estavam à espera de notícias no hospital. Porém, o zagueiro não reagiu aos choques e atendimento médico no local e veio a falecer às 22h45.
Confira na íntegra o boletim médico da época:
"Informamos que o jogador teve o primeiro atendimento médico ainda no gramado do estádio do Morumbi pelas equipes médicas, sendo imediatamente transferido para o Centro Médico do estádio, onde foram iniciadas as manobras do protocolo de ressuscitação cárdiopulmonar, que tiveram continuidade durante a remoção por ambulância UTI até o hospital São Luiz.
O jogador deu entrada no hospital às 22h05 e, apesar de todos os esforços da equipe médica que o assistiu, o mesmo veio a falecer às 22h45.
Assinado: Diretoria Clínica.”
22h57 – Nairo anuncia morte de Serginho

Gazeta Press
Emerson Leão consola Anderson Lima: jogadores já temiam o pior por Serginho
Presidente do São Caetano até hoje, Nairo Ferreira de Souza é o responsável por transmitir a péssima notícia. "Aconteceu o pior, não tem o que fazer”, disse o dirigente no hospital. Por lá também está Marco Aurélio Cunha, que representava o São Paulo. “Como médico e representante do clube não poderia me eximir. Assim que cheguei me avisaram. Fiquei por lá para prestar esclarecimentos sobre o atendimento e dar suporte à família e amigos do Serginho”.
O fim trágico não demora a chegar ao conhecimento dos companheiros de equipe. Marcinho conta que soube da morte do amigo dentro do ônibus, no trajeto entre o estádio do Morumbi e a cidade de São Caetano do Sul.
“Estávamos preocupados no vestiário e fomos para o ônibus. Lá dentro, o diretor do clube levantou e disse que ele estava bem, mas dois minutos depois ele se ergueu de novo e avisou que ele tinha acabado de falecer. Foi um choque muito grande, todos começaram a chorar ali mesmo”.
Serginho deixou a esposa Helaine Cunha e o filho Paulo Sérgio, com quatro anos na época. O corpo do zagueiro foi velado e sepultado no Cemitério do Vale da Saudade, em Coronel Fabriciano, cidade onde o defensor começou a carreira, em Minas Gerais.