Se você é um dos que grita por aí "Fora Leco" e reza pela renovação política do SPFC, vou pedir que acompanhe meu raciocínio até o fim. Vivemos mais um momento claro de oportunismo político no Conselho acontecendo e é preciso analisar situações isoladamente pra entender uma teia de conexões e aproveitam das opiniões chamadas de "massa de manobra": vamos começar pelas declarações do diretor de futebol, Raí, que pode custar seu cargo.
O Raí cumpre hoje quarentena na casa dele e atendeu ao convite do repórter do GloboEsporte para uma entrevista sobre a postura do SPFC em relação à possibilidade de retorno dos treinamento caso a FPF liberasse mesmo com o aumento de número de mortes diárias pelo novo coronavírus.
Durante a entrevista, o repórter lembrou que Raí é irmão de Sócrates, ídolo já falecido do Corinthians que teve forte atuação política em âmbito nacional nos anos 80 nas lutas pelas "diretas já" e também mudou o rumo da história política do Corinthians e foi um dos criadores do movimento Democracia Corinthians e até fez parte das discussões iniciais do Clube dos 13.
Inserido neste contexto, o repórter perguntou a opinião de Raí sobre as medidas do governo Jair Bolsonaro em relação ao combate à pandemia, a demora em tomar decisões que auxiliassem, inclusive, o retorno do futebol e o cenário de guerra política instaurado entre governadores x presidente.
A frase inicial da resposta do diretor foi "quero começar dizendo que opino sim, mas não falo como diretor de futebol do SPFC neste momento..."
Municiado e bem fundamentado de números e informações, Raí expressou-se negativamente contra Bolsonaro, o governo, a política, a forma como o combate está sendo conduzido e, principalmente, o fato do presidente ser contra a quarentena mas não criar meios de torná-la menos danosa à economia.
A discussão AO VIVO entre Caio Ribeiro que disse "só tem que falar de esporte" e Casagrande que disse que é "antidemocrático" não permitir que Raí tenha uma voz sendo quem é, trouxe mais intensidade.
Aqui entre o oportunismo do Conselho Deliberativo no São Paulo mais uma vez.
Pra quem não sabe, a família de Caio Ribeiro é associada e alguns compõem parte do Conselho e exercem influência em alguns grupos. "O Raí é uma pessoa pública e tem todo o direito de expressar suas opiniões. Agora, não pode, quando está exercendo um cargo no São Paulo e, questionado sobre condutas do futebol, como diretor assalariado, fazer críticas ao governo. O estatuto do clube não permite manifestação política", disse o pai do Caio à folha de SP, Conselheiro Dorival Decoussau.
O primeiro erro da declaração citada trata-se de uma realidade entre a maioria dos Conselheiros que não conhecem o próprio Estatuto do SPFC mas adoram falar sobre ele. O texto do "Estatuto e Regime Interno" não fala ABSOLUTAMENTE NADA sobre um diretor executivo contratado manifestar opinião política/religiosa/afins - erro de gestão que não trouxe este tópico e agora não sabe como lidar com este tipo de crise - apenas fala sobre associados não poderem exercer este tipo de opinião nas dependências do clubes, somente.
O SPFC não tem um Código de Conduta para os profissionais que impossibilite Raí de opinar, em sua casa, uma situação política. A ausência do Código de Conduta faz com que o Estatuto torne-se o texto-base nessa discussão e, de novo, não tornaria cabível sequer advertência ao Raí, muito menos demissão. Então surge a dúvida: por que discutir a demissão do Raí agora? Se não for uma manifestação política contra a opinião do diretor, o que mais seria?
Quero lembrar que Dorival Decoussau já havia pedido a saída de Raí ao presidente Leco em Fevereiro do ano passado em ofício assinado pelo seu grupo e entregue em mãos ao presidente quando o diretor completava apenas 1 ano de função e trabalhado apenas uma temporada e uma janela de transferência - levando em conta que a janela 17/18 foi costurada ainda por Víncius Pinotti e entregue em andamento para Raí.
Em tempo: o ex-presidente Lula apimentou twittando em apoio ao Raí relembrando o sangue de Sócrates e os conselheiros piraram com a manifestação pública, criaram um requerimento e tentam colher assinaturas para ocasionar a demissão do Raí. De novo, estão contra o diretor Raí ou contra sua opiniões políticas?
Se você é como eu e sonha com a renovação política do São Paulo, vou te dizer uma coisa: é preciso enxergar além dos detalhes. Passo um: o manifesto dos jogadores que no final do ano passado atacaram a política do SPFC publicamente através, por exemplo, de declarações públicas do Daniel Alves dizendo que é difícil trabalhar no ambiente do SPFC.
Depois com fotos em redes sociais dizendo "Esse é o nosso diretor de futebol" quando se classificaram pra Libertadores nas ´últimas rodadas do campeonato brasileiro. Na ocasião, o Leco tentava demitir Raí pra colocar o conselheiro Carlos Belmonte na diretoria de futebol afim de trazer uma frente política que se fortalecesse a ponto de, quem sabe, enfrentar internamente o nome de Julio Casares para a indicação à sucessão.
Nomes como Muricy, Raí, Lugano, Rogério Ceni e qualquer outro ídolo que julguemos idôneos, competentes e com DNA São Paulino, não farão uma mudança significativa do dia para a noite e nem de um ano para o outro: é preciso criar uma estrutura de força tarefa interna para combater a influência politica no futebol sem expor o que acontece no dia a dia para não piorar o ambiente.
Leiam nas entrelinhas. Muricy disse recentemente em entrevista que foi HORRÍVEL ser treinador na gestão Leco de futebol porque ele se metia em tudo, imagine como é gerir o futebol com Leco de presidente? Agora una este raciocínio aos pequenos erros de gestão no futebol nos últimos 2 anos que mesmo assim teve o melhor elenco/resultado desde o tricampeonato brasileiro.
Se você idealiza uma renovação política precisa enxergar além do trivial e entender que ela demanda apoio, confiança e tempo.
Raí, não por você ser impossibilidade por Estatuto(isso não), mas por estratégia política dentro do São Paulo: tente abster-se de comentário de âmbito nacional. Já são guerras demais para enfrentarmos.